21 de mai. de 2011

Sem mais





"Se alguém te perguntar o que você quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo."

Mario Quintana

7 de mai. de 2011

Argentina estuda dar pensão a escritores‏


Por LUCAS FERRAZ
DE BUENOS AIRES 
A Argentina quer instituir uma pensão social para escritores. A ideia, inspirada em leis aprovadas na França e na Espanha, é defendida há anos por um grupo de escritores do país. 
A pressão é tanta que já são dois projetos --quase similares-- em trâmite no Senado. "Com a barriga vazia, o escritor não escreve", diz o poeta Miroslav Scheuba, coordenador da Sociedade Argentina de Escritores. "Como escritores são boêmios, não economizam e acabam sem nada", completa. 
A entidade já conseguiu aprovar o projeto em Buenos Aires, em 2009. São 100 escritores beneficiados, que recebem por mês 2.650 pesos --cerca de R$ 1.080. A prefeitura da cidade analisa atualmente o pedido de pensão de outros 30 autores.
Pelos cálculos do governo, no âmbito federal, seriam quase mil beneficiados. 
Os requisitos para o autor postular à pensão é não ter fonte de renda --ou tê-la menor que o valor da bolsa-escritor. É necessário ter mais de 60 anos, ter se dedicado mais de 20 anos à atividade literária ou publicado mais de cinco livros. Outro quesito essencial é morar há pelo menos 15 anos na Argentina. 
No final de abril, o deputado governista Carlos Heller apresentou um outro projeto com quase as mesmas propostas. A diferença é que a idade mínima para receber a pensão é de 65 anos, e o escritor necessita ter contribuído pelo menos 15 anos com a previdência. 
"A finalidade é dar uma retribuição e reparar as situações de injustiça e descuido", conta Heller. 
Em 2007 e 2008, respectivamente, morreram os escritores argentinos Ruth Fernández e José Luis Mangieri. Estavam em dificuldades e desamparados, dizem os defensores do projeto. 
Julio Cortázar e Jorge Luis Borges tiveram vida regrada. Em Paris, onde viveu, Cortázar trabalhou com traduções.
Borges chegou a fazer graça de sua situação financeira precária. Certa vez, ele comentou sobre um sapato usado que ganhou de presente da primeira mulher: "Não eram sapatos de segunda mão, eram sapatos de segundo pé". 


AP
Sem amparo do governo, o escritor argentino Jorge Luis Borges teve vida regrada
Sem amparo do governo, o escritor argentino Jorge Luis Borges teve vida regrada

VOZ CONTRÁRIA
Segundo os escritores engajados na causa, o governo aprova a ideia. Mas o projeto deve ser votado somente em outubro, depois das eleição presidencial. 
Contra o projeto, um dos principais nomes da literatura contemporânea da Argentina, Cesar Aira, diz: "Faz tempo que se discute isso por aqui. Sou contra". 
Aira comenta o caso do México, onde uma lei garante a qualquer pessoa maior de 18 anos, após escrever um livro, pensão vitalícia do Estado. "Não acredito que isso seja bom para a literatura."


1 de mai. de 2011

Tortas


Por Tainá Pires e Tatiana Yaguiu

Saímos de uma peça de palhaços na calçada da Reitoria, apaixonadas pelo Sarrafo. O que fazer numa sexta à noite?  Para onde ir? Nada como um bom e  velho bar. Velho não mais, porque a modernidade se instalou por lá.
Chegamos com uma sensação nova. Olhamos com uma cara de espantadas com as novidades.
Olha só, meninas vestidas num estilo “saído da casa da vovó”, carregando livros e andando pelo local estreito como se tivessem na passarela. Os livros, um adereço estiloso. Será mesmo necessário mostrar? Atingem algum resultado? O que será que procuravam? Lembramos da decoração de casas também estilosas, em que livros falsos, aqueles só de borda, deixam o ambiente mais inteligente. Uma das teorias é que os livros saíram das casas e começaram a se transformar em um novo acessório da moda ornamental ou quem sabe um novo adereço ‘pega rapaz’ contemporâneo.
Entre um olhar e outro, pegamos uma cerveja.
Um cara de blazer, alinhado e solitário. A cor clara da pele e do tecido estavam em harmonia, a calça social escura, sapato e óculos de grau, completavam o estilo: sozinho na porta do bar. Esse sim era uma das pessoas mais intrigantes, não sabemos dizer o que ele é ou na verdade quem ele queria ser com aquela roupa, com aquela postura altruísta/arrogante em frente ao um bar lotado. Mas quem há de saber, não é verdade? Talvez nem ele.
Olhamos uma à outra, e bebemos mais um gole.
Já achamos graça, porque transmitimos por pensamento “Nós estamos desatualizadas, ou o mundo está de ponta cabeça?”
Precisamos fazer render essa vinda ao bar!
Boa idéia,  disse Tati, pegando o bloquinho e a caneta.
Voltamos nossos olhares para uma roda. A roda das risadas. Mulheres emperiquitadas, fingem conversar algo interessante e riem alto, procurando o resultado, olhando para os lados, empinando as bundas para destacar suas qualidades.
Eu não aguentaria um bando numa roda que nem sequer me ouvem olhando nos olhos, falou uma das duas.
Nada como os bons tempos. Que saudades de quando não tinha aquele quadro luminoso da Marllboro, entre os quadros do Garrincha.
Olhamos saudosamente para o balcão, seus banquinhos altos e para nossa alegria vimos uma mulher “normal”, com o seu bebê de colo pedindo um bolinho de carne.
Procuramos os que jogavam aquela sinuca.
Não sei, mas acredito que foram expulsos dali.
Estávamos sentadas numa posição privilegiada. Porque podíamos olhar todos os lados. O ruim era que ficava sobre a nossa cabeça um telefone público, decorativo, de ficha. Bonito, mas não dava para ficar com a coluna ereta. Esteve sempre por lá, algumas das poucas coisas que não mudaram com o tempo.
O que nos surpreendeu foi quando apareceu um mulher com salto alto, de verniz, outra com corte e escova no cabelo digna de celebridade (essa expressão eu arrasei na contemporaneidade, hein Tati?) sentimos como se estivéssemos em um dos lugares mais badalados da cidade.
Achei mesmo, pela primeira vez, que estava em um lugar da moda, disse Tati.
Nesse mundo de transformação, outra coisa bizarra foi vista: John Lennon! Ou seria Jesus Cristo? Já não sabíamos quem ele era realmente... Até discutimos um instante.
Que loucura!
Será que bebemos demais?
Mas ele, apesar na camisa hippie, tem os olhos muito bonitos e poéticos, como se olhando para além do horizonte. Confesso agora. (voz de Tainá)
E o mais engraçado da noite foi descobrir que havia uma festa de aniversário sendo comemorada ali. Não percebemos se estavam cantando parabéns, mas sim um rapaz passando com um chapéu de aniversário. Passeava pelo bar sem se importar.  Ou talvez quisesse dizer: estou numa festa. Uma coisa não ficou clara nessa festa: será que tinha bolo?
Começamos a conversar com uns rapazes, aqueles que nos deram metade da mesa e que nós não sabíamos nem o nome deles até então.
Enquanto Tainá filosofava sobre alguma coisa que ninguém entendia, Tati olhava para um deles e voltava o olhar para o caderninho. Começamos a nos enturmar.
Ao descobrir que ele, o personagem que Tati registrava com rabisco, estava enrolando um palheiro, Tainá se animou.
Agora sim me sinto normal entre os semelhantes!, disse Tainá.
Naquela altura, as pessoas ao redor do bar já estavam olhando para o chão, para não tropeçar, e tudo ficou mais familiar para nós duas. Uma pena demorar tanto para se identificar, tivemos que nos despedir, correr para pegar o ônibus.